O texto aprovado permite que os estudantes de todas as idades levem o telefone na mochila, mas restringe seu uso durante as aulas, no recreio e em outros intervalos. A nova redação modifica a proposta aprovada na Comissão de Educação da Câmara, que proibia até que alunos da educação infantil e dos anos iniciais do ensino fundamental (1º ao 5º ano) levassem o aparelho para a escola.
Segundo o deputado Renan Ferreirinha (PSD-RJ), a mudança atende a um pleito feito pelas famílias, que querem ter contato com os filhos para saber se os estudantes chegaram ao colégio, por exemplo. Pesquisa da Nexus mostrou que 86% são contrários ao uso irrestrito de celular. Desses, 54% são a favor da proibição total e 32% acreditam que o uso do celular deva ser permitido apenas em atividades didáticas e pedagógicas.
O PL aprovado na Câmara prevê
- Uso do celular proibido em todas as etapas da educação básica (educação infantil até o ensino médio) em sala de aula, no recreio e nos intervalos de aula;
- Uso permitido para fins pedagógicos sob orientação de educadores, ou para promover acessibilidade de alunos com deficiência;
- Uso permitido em situações de estado de perigo, estado de necessidade ou caso de força maior.
- Todos os alunos poderão portar o celular, mas sem utilizá-lo.
O projeto de restrição do uso de celulares nas escolas conseguiu apoio do governo e da oposição, mas passou com menos tranquilidade pela CCJ do que pela Comissão de Educação. Na sessão da CCJ, a deputada bolsonarista Julia Zanatta (PL-SC) chegou a pedir que o projeto fosse retirado da pauta.
O pedido foi rejeitado por 27 a 8. Zanatta argumentou que é importante discutir a restrição do uso, mas disse que diariamente recebe relatos de estudantes que são alvo de "doutrinação" e proselitismo político por parte dos professores.
Trecho incluído pelo relator Renan Ferreirinha (PSD-RJ) abre brecha para que estudantes possam filmar professores em sala de aula. No artigo sobre as exceções para gravação, Ferreirinha incluiu que os aparelhos podem ser utilizados para "garantir os direitos fundamentais". Nos bastidores, deputados de situação afirmam que a inclusão era necessária para garantir que o texto passasse na CCJ.
O relator acrescentou ainda exceções para a proibição: situações de estado de perigo, estado de necessidade ou caso de força maior".
Embate entre conservadores
Durante a sessão, Julia Zanatta se manifestou em mais de uma ocasião contra o projeto, argumentando que fere as liberdades individuais dos estudantes. Outros parlamentares conservadores, como Capitão Alberto Neto (PL-AM), apoiaram o texto. A discordância gerou embate entre os deputados.
"Está precisando de menos 'bundamolismo', menos frouxidão para avançar em pautas necessárias, firmes e fortes em defesa das nossas liberdades", disse a deputada, afirmando que na direita há "revolucionários de marcha lenta", que sempre cedem à esquerda.
Após a declaração, o capitão Alberto Neto rebateu: "Só para lembrar a nobre deputada que já troquei tiro com bandido, enfrentei governo, prefeitura, esquerda, centro. Uma coisa que não fui foi bunda mole. Agora, muitas vezes, o projeto que aprovamos aqui não está do jeito que sonhamos e precisamos reduzir os danos", disse.
Os deputados Marcos Pollon (PL-MS) e Diego Garcia (Republicanos-PR) tiveram o microfone cortado pela presidente da CCJ, Caroline de Toni (PL-SC) após discutirem aos gritos na comissão. Garcia foi relator do projeto na Comissão de Educação e foi chamado de hipócrita por Pollon, contrário à proposta.
Em meio ao racha entre conservadores, o deputado Nikolas Ferreira (PL-MG), presidente da Comissão de Educação, foi ao plenário da CCJ para defender o projeto. Nikolas afirmou que atuou em articulações de bastidores.
Ele afirmou que a possibilidade de uso de aparelhos eletrônicos para garantia dos direitos fundamentais, incluída no texto pelo relator, deixa os alunos protegidos. "Se não fosse esse projeto, seria um do governo federal. E o projeto viria muito pior do que o que está aqui", argumentou.
Governo atua para acelerar tramitação no Senado
Em setembro, o ministro da Educação, Camilo Santana, afirmou publicamente que o MEC enviaria um projeto próprio para tratar do tema. Após articulações, no entanto, ele abriu mão da proposta e passou a apoiar o texto em tramitação na Comissão de Educação, sob relatoria de Diego Garcia). Apesar do consenso entre oposição e governo, nos bastidores, o ministro e deputados travavam disputa velada pelo protagonismo da proposta.
O ministro tem conversado com o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), para acelerar a tramitação do projeto na Casa. O ministro quer que o texto entre em vigor já no próximo ano. Alguns parlamentares da área, consideram que não será possível finalizar as votações ainda neste ano.
"Não tem a menor chance. O governo quer a reforma tributária, o ajuste de gastos, o governo quer tudo. Não vai conseguir entregar tudo", analisa o presidente da Frente Parlamentar Mista da Educação, deputado Rafael Britto (MDB-AL).
Restrição em São Paulo
No mês passado, a Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp) aprovou a restrição do uso do dispositivo em escolas. A medida foi sancionada pelo governador Tarcísio de Freitas na semana passada. Desde 2007 há legislação sobre o tema em alguns Estados, no entanto, as leis acabaram esbarrando na dificuldade de implementação.
Recentemente, o tema foi tratado em um estudo da Unesco. Segundo a pesquisa, o uso de celulares na escola impacta negativamente na aprendizagem e na concentração dos estudantes. O tema tem sido discutido em outros países do mundo. Recentemente, a Finlândia e a Holanda instituíram legislação sobre o tema.
Estudo da Unesco, braço das Nações Unidas para a educação, mostrou que um em cada quatro países proíbe o uso de dispositivos ou tem políticas sobre o uso de celulares em sala de aula. Pesquisas mostram que o uso de celulares tem impacto na aprendizagem dos estudantes por funcionar como distração. Recentemente, a Finlândia, conhecida pela qualidade de seu sistema educacional, proibiu o uso desses aparelhos nas escolas.